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6.8.17

Edifício Capitólio (Boavista)

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Numa cidade como esta ...

Existem dois edifícios com o mesmo nome. O outro encontra-se na praça General Humberto Delgado.


25.6.17

Rua Cinco de Outubro (2017)

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23.6.17

Rua Capitão Henrique Galvão

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Sobre Henrique Carlos da Malta Galvão pode continuar a ver aqui.

Urbanisticamente é mais uma daquelas ruas em "U" que existem na cidade.

 

31.1.15

31 de Janeiro 2015

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Aqueles homens que se bateram, nesta artéria da cidade, pela República e pela Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade em Janeiro de 1891 e em Fevereiro de 1927 alguma vez pensariam que em pleno século XX, em pleno Inverno, existiriam situações como esta?


23.4.14

Personagens da República no Porto


Alguns deram nome a ruas, jardins ou outros locais da cidade.

Nascidos ou não no Porto aqui viveram ou lutaram pelo ideal da República, durante a Monarquia e durante o Estado Novo.

(Listagem, sem dúvida, incompleta)


António Amaral Leitão (capitão Leitão) - 7/3/1845 - 14/1/1903

António Luiz Gomes - 23/9/1863 - 28/8/1961

Augusto de Castro Sampaio de Corte-Real (Augusto de Castro) - 11/1/1883 - 24/7/1971

Augusto Manuel Alves da Veiga - 28/9/1849 - 2/12/1924

Augusto Rodolfo da Costa Malheiro (alferes Malheiro) - 19/1/1869 - 9/12/1924

Aurélio da Paz dos Reis - 28/7/1862 - 18/9/1931

Aníbal Augusto Cardoso Fernandes Leite da Cunha - 1868 - 16/3/1931

Abel Salazar - 19/7/1889 - 29/12/1946

Basílio Teles - 14/2/1856 - 10/3/1923

Duarte Leite Pereira da Silva - 11/8/1864 - 29/9/1950

Eduardo Ferreira dos Santos Silva - 18/3/1879 - 14/9/1960

Ezequiel Pereira de Campos - 12/12/1874 - 26/8/1965

Francisco Xavier Esteves - 8/10/1864 - 2/9/1944

Hélder Ribeiro - 19/7/1883 - 10/11/1973

Jaime Zuzarte Cortesão - 29/4/1884 - 14/8/1960

José Domingues dos Santos - 8/5/1887 - 16/8/1958

José Joaquim Rodrigues de Freitas - 24/1/1840 - 27/7/1896

José Pereira de Sampaio (Bruno) - 30/11/1857 - 6/11/1915

Joaquim de Azevedo Sousa Vieira da Silva Albuquerque - 16/8/1839 - 21/1/1912

Leonardo José Coimbra - 30/11/1883 - 2/1/1936

Manuel Maria Coelho - 6/3/1857 - 9/1/1943

Manuel Pinto de Azevedo - 27/4/1874 - 17/2/1959

Raul Germano Brandão - 12/3/1867 - 5/12/1930



21.4.14

Rua do Heroísmo (1974-2014)


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Naquele sinistro casarão, que faz esquina da Rua do Heroísmo com o Largo de Soares dos Reis (agora Largo de Catarina Eufêmia), e onde muitas pessoas mudavam de passeio para se afastarem da sua proximidade, funcionou, durante longos anos, a Delegação no Porto da PIDE, a que Marcelo Caetano, numa mera mudança de designação, passou a chamar DGS. A PfDE-DGS do Porto tinha duas entradas : uma pelo Largo de Soares dos Reis, com escadas de passadeira e contínuos fardados, era a entrada para «inglês ver», a entrada «oficial», onde eram atendidos os que ali eram chamados ou iam tratar de qualquer problema de passaportes, nomeadamente os estrangeiros; a outra era a face real da PIDE, na Rua do Heroísmo (e nunca o nome de uma rua foi tanto o símbolo dos que lá entravam e conseguiam resistir às torturas), um portão de ferro, com uma pequena porta de entrada, a dois palmos do chão, que só se abria para deixar entrar os presos ou os seus familiares, que os iam visitar, e que estabelecia contacto com o átrio de acesso às prisões (celas, quartos e salas) e ao curto lanço de escadas de acesso, pelo lado real, do edifício onde funcionavam todos os departamentos da PIDE-DGS, desde as salas de escuta telefónica e gravações, até aos gabinetes dos chefes, inspectores e director, e àqueles, no último andar, onde os presos eram interrogados e torturados. Quem entrava pela escada de passadeira do Largo de Soares dos Reis, e assim não passava desta parte do edifício, nunca podia fazer ideia de tudo aquilo que constituía a verdadeira PIDE, e que estava para lá daquela fachada. Esta série de fotografias da Delegação no Porto da PIDE-DGS, obtidas logo após o 25 de Abril, desde a complicada aparelhagem de escuta telefónica e gravação, os montes de livros apreendidos, as pastas de processos individuais, que vão até ao número 53067, o enorme ficheiro de 80 gavetas, o parlatório das visitas, o arsenal de armas amontoadas, o luxo do gabinete do director contrastando com a pobreza rudimentar das saias dos presos, até aos relatórios, meio calcinados, de gravações telefónicas, o envelope apreendido duma carta, agentes da PIDE-DGS ocultando as caras, já conduzidos sob prisão, a alegria da saída dos presos e a essa extraordinária imagem de um soldado erguendo um ramo de cravos no meio da alegria de milhares de populares, que, até à hora da rendição da PIDE, apoiaram as Forças Armadas, estando sempre a seu lado, constituem imagens que se não podem esquecer. Sem serem tudo o que era a sede da PIDE no Porto — basta lembrar a falta de fotografias das celas subterrâneas onde os presos, às escuras ou com a escassa luz dos estreitos postigos gradeados à altura das pernas de quem passava na Rua do Heroísmo, cumpriam longos períodos da chamada incomunicabilidade, com um balde a substituir as funções de retrete, constituem, porém, um primeiro documentário sobre as instalações da PIDE-DGS que ilustra os brutais e maquiavélicos métodos de actuação desta polícia do fascismo português, que foi um dos seus órgãos fundamentais para a implantação e a sobrevivência do regime de domínio violento das mais reaccionárias camadas do grande capital monopolista sobre o povo português, durante quarenta e oito anos.

Forçada a organizar-se, em moldes de legalização, em 1945, com a vitória das Nações Unidas sobre o fascismo, a PIDE apresentava, em relação aos processos crimes de direito comum, a insólita peculiaridade de os seus processos políticos, após as declarações dos arguidos, apresentarem em seguida a afirmação, subscrita por dois agentes, de que aquelas declarações tinham sido prestadas «sem qualquer espécie de coação ou violência», como se coação não fosse só por si a própria entrada do preso na PIDE, dado o pavor que a sua actuação despertava na generalidade das pessoas, e como se violência não fosse também a prisão por meros delitos de opinião e todo o regime penal dos presos políticos, sujeitos, além do mais, a um regime «legal» de seis meses de prisão preventiva! Durante perto de vinte anos, todos os processos organizados pela PIDE aos presos políticos não deixavam de acrescentar às declarações dos arguidos esta afirmação abonatória, subscrita por dois agentes, de que as declarações, afinal obtidas através dos mais sórdidos meios de tortura, «tinham sido prestadas sem qualquer espécie de coacção ou violência». E só depois de, nos julgamentos dos Tribunais Plenários, os advogados que defendiam os presos políticos começarem a denunciar tal fórmula como prova indirecta da coacção e da violência nos interrogatórios e respectivas declarações, pois se elas não existissem não seria preciso admitir a sua probabilidade e negá-la sistematicamente, a PIDE acabou por abandonar a fórmula, que mais a comprometia do que a defendia, ao contrário das suas intenções.

Era, de resto, tal o estado de coacção dos presos que, em 1931, após o assassínio pela PSP dó estudante João Martins Branco, ao oficial da PSP que comandara o assalto à reunião dos estudantes do Porto, estudantes de Medicina, mandaram, pelo correio, a cabeça dum cadáver; a PIDE prendeu diversos estudantes, entre eles António Ramos de Almeida, que viria a ser um conhecido escritor e lutador antifascista, infelizmente já há anos falecido, e que tinha então apenas 17 anos. Conduzido à presença de um chefe da PIDE para ser interrogado, em cuja secretária estava a cabeça do cadáver enviada ao oficial da PSP, e à pergunta se sabia de quem era aquela cabeça, Ramos de Almeida, tal era já em 1931 a reputação da PIDE, e tão alheio estava à acusação, que respondeu ser aquela a «cabeça dum preso».

A quem, desde 1949, pôde prestar, a mais de setenta presos políticos, a solidariedade de tomar a sua defesa, em trinta e dois processos, estas imagens são inseparáveis dos nomes de tantos dos melhores filhos do nosso Povo que passaram peta Delegação no Porto da PIDE-DGS e ali foram torturados, com as mais requintadas torturas, desde o isolamento de semanas e meses, em celas subterrâneas, até às selváticas agressões a soco, a pontapé e a cavalo-marinho, aos insultos mais soezes e à «estátua» e privação do sono, durante dias e noites consecutivas. Rever as instalações da PIDE é, necessariamente, recordar, além de tantos outros, os 16 mineiros de São Pedro da Cova, ali presos em 1959, os 15 trabalhadores de Fafe, ali presos em 1951, os 5 trabalhadores de Custóias, igualmente ali presos em 1950, os 4 padeiros do Porto, também ali presos em 1959, e até praticamente uma aldeia inteira de Montalegre, com homens e mulheres, velhos e novos, que encheu as prisões da PIDE, sob a acusação de ter ajudado dois guerrilheiros espanhóis que se haviam refugiado em Portugal, após o termo da guerra civil espanhola.

E recordar igualmente tantos antifascistas que por ali passaram, a maior parte várias vezes, e ali sofreram corajosamente longas prisões, com todo o seu cortejo de arbitrariedades e prepotências, como Ruy Luis Gomes, Óscar Lopes, Virgínia Moura, Lobão Vital, António Macedo, Mário e Carlos Cal Brandão, do Porto; Vítor de Sá e Humberto Soeiro, de Braga; Lino Lima, de Vila Nova de Famalicão; António Ribeiro da Silva, de Viana do Castelo; e tantos outros cuja enumeração seria praticamente infindável.

E evocar ainda os militantes do Partido Comunista Português, o grande Partido da resistência contra o fascismo em Portugal, sobre os quais a PIDE desencadeou sempre a mais feroz repressão, submetendo-os às mais violentas formas de tortura, sem conseguir vergar a sua permanente atitude de luta contra o fascismo até com desprezo da própria vida, para o que bastará lembrar os nomes de alguns desses heróis da luta antifascista que continuam hoje um combate que iniciaram há já longos anos, em plena juventude, e que na Delegação no Porto da PIDE começaram a sofrer as brutais torturas, como Carlos Costa, de Fafe, em 1948, com pouco mais de vinte anos, mantido isolado durante cinco meses, e cujo pai foi preso como refém, durante 20 dias, como odiosa tentativa de obrigar Carlos Costa a ceder, e cuja absoluta negativa lhe haveria de valer a absolvição no Plenário mas a condenação em medida de segurança de internamento de 6 meses a 3 anos, por ser considerado «perigoso», o que constituiu o único caso de aplicação somente de medida de segurança no Plenário do Porto; Jorge Araújo, do Porto, preso a primeira vez em 1958, com 22 anos, e que ali viria a ser agredido a soco, a pontapé, e à régua, nas partes mais sensíveis do corpo, e que esteve 11 dias e 11 noites sem dormir; Mário Sena Lopes, do Porto, preso em 1961, agredido a soco e a pontapé, e batendo-lhe com a cabeça nas paredes, 7 dias e 6 noites sem dormir, um ano e quatro meses em regime de isolamento; Maria José Ribeiro, de Matosinhos, presa em 1962, com 26 anos, agredida a soco e com um chicote, um mês incomunicável; Hernâni Silva, do Porto, preso a primeira vez em 1950, com 23 anos, agredido a soco por 5 agentes, ao ponto de lhe rebentar o sangue pelo nariz e ouvidos, e chicoteado nas pernas durante sete horas, um dia; e 5 horas noutro dia, 14 dias às escuras numa cela subterrânea, e novamente preso em 1952, e cinco meses e meio isolado nas celas subterrâneas; Mário Araújo, de Fafe, preso, a primeira vez, em 1956, com 20 anos, mantido 6 meses numa cela subterrânea; e muitos outros que nas instalações no Porto da PIDE começaram a ser vitimas da sua abnegada e heróica luta contra o fascismo e em defesa do povo português.

E, finalmente, não se pode deixar de recordar os nomes de alguns dos assassinados pela PIDE no Porto, como Gervásio da Costa, operário têxtil de Fafe, que em consequência das torturas tuberculizou, em 1949, na Delegação no Porto da PIDE, vindo a morrer pouco depois; Manuel da Silva Júnior, de Viana do Castelo, que a PIDE pretendeu ter-se «suicidado» em 3 de Março de 1957, tal como pretendeu também apresentar como «suicídio», em 13 de Fevereiro de 1957, a morte do barbeiro de Fafe, Joaquim Lemos de Oliveira, após nove dias e nove noites da tortura da «estátua» e com as agressões de que foi vitima a soco, a pontapé e a cavalo-marinho.

As imagens da Delegação da PIDE-DGS no Porto estão indissoluvelmente ligadas a tantos vivos e mortos que ali foram torturados. E será com a trágica recordação dessas imagens que o povo português saberá dizer não ao fascismo. O fascismo não voltará a Portugal. O fascismo não passará.

Raul Castro

Texto publicado em "O ÚLTIMO DIA DA PIDE 26 DE ABRIL NO PORTO"
(edição do Movimento Democrático do Porto - 1974)

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Duas notas sobre a rua do Heroísmo:

- Já teve o nome de Rua do Alecrim, rua de S. Lázaro e rua do 29 de Setembro.

- "Na planta de Costa Lima, de 1839, aparece como Rua de 29 de Setembro. Derivava aquele topónimo da evocação do mais sanguinolento combate durante o cerco, na Quinta da China, nesse dia e mês de 1832, entre liberais e miguelistas. Recebeu o nome de Rua do Heroísmo para lembrar os actos valorosos praticados nesse recontro de 29 de Setembro. Já assim se chamava em 1877... "
"Toponímia Portuense" de Eugénio Andrea da Cunha e Freitas


Sobre o edifício: Actualmente é ocupado pelo Museu Militar do Porto. Alguns anexos do tempo da Pide já foram destruídos, nomeadamente aqueles que se encontravam junto do portão da rua do Heroísmo. Bem ao fundo ainda se encontra um pavilhão onde há poucos anos era visível a inscrição "P. V. D. E." (Polícia de Vigilância e Defesa do Estado). 


4.3.14

Os Fenianos e Aquilino Ribeiro


Carnaval!

Carnaval!

Como bons portuenses é a época em que nos relembramos do Carnaval dos Fenianos.

Mas a acção, a longa acção deste clube da cidade não se resumia somente aos cortejos e bailes que tinham lugar nesta época do ano. Os Fenianos sempre tiveram um papel importante na divulgação das Artes e das Letras. É sempre bom relembrar ou divulgar que o grupo de pessoas que fundariam o T E P (Teatro Experimental do Porto) começaram por terem abrigo nos seus locais. 

Assim resolvi divulgar o texto de uma conferência de Aquilino Ribeiro (Sernancelhe, Carregal, 13 de Setembro de 1885 — Lisboa, 27 de Maio de 1963)em comemorações do seu cinquentenário en tanto que escritor, na sede do Clube em 1963.


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DISCURSO PARA O BANQUETE NO CLUB DOS FENIANOS



Estou profundamente sensibilizado com a homenagem que os primeiros representantes desta nobre cidade do Porto se dignaram prestar ao obreiro das letras que há mais de meio século vem batendo o seu tambor de Waterloo – Waterloo – repetirão V. Exas. interrogativamente. Pois que é a vida, direi eu, com a caducidade de tudo e o inevitável baixar do pano, senão uma intérmina e perpétua batalha perdida? Com honra ou sem ela, eis o dilema que se pospõe à nossa condição efémera.
Agora vendo-me rodeado de senhores de tão vincante personalidade, por tudo isto ou aquilo, em minha consciência me pergunto se mereço este desvanecedor Domingo de Palmas. Bem sei que está presente o autor dumas dúzias de livros; o cultor probo da língua; o literateiro dum vasto guinhol. Sim, ao meu activo contam esses estirados actos de boa intenção. Todavia deixem-me dizer-lhes sem falsa modéstia, que acima de tudo, dos dotes inatos do entendimento, é o esforço e a constância no esforço que fazem, tanto na prática das letras como em qualquer outro mister, o artífice consumado. À face dessa obra recôndita e misteriosa da vontade, o meu artesanato não vale mais que o do humilde tecelão de tapetes de Arras, do entalhador de madeira de capela-mor, ou do oleiro, para não ir mais longe, que tira de olho as linhas de beleza da sua cerâmica. O cérebro é uma admirável máquina electrónica e torna quem assim o quer, mas quer a valer, num compositor, num poeta, digamos mesmo num homem rico e de mando entre os homens. A questão é que os neurões se vão condicionando e ordenando na cadeia psíquica que conduz a determinado objectivo profissional.
Bem certo que, tratando-se de escritores, a vontade de realizar opera sobre um teclado admirável em que se acrisolou o trabalho continuo e acepilhante das gerações através das vicissitudes dos tempos. Qualquer tecla é uma maravilha de engenho e subtileza. Em cada uma delas se depositou, concentrada e afinada mediante infinitos factores do mundo real, uma experiência específica. Por outra é o seu mais justo expoente. Assim sucede que a palavra pode caracterizar uma natureza de indivíduo; o seu estado de alma; os seus gestos mais fugazes: uma atitude; uma emoção tão bem como um impressionista pinta uma paisagem.
A língua, vista nas suas flexões e infinitas modalidades prosódicas e sintáxicas, como raízes, desinências, sufixos e prefixos, etc. etc. retrata o povo que a fala. Basta fazer-lhe a análise espectral. Ouça-se o latim e compreende-se o peremptório, a soberba, o espírito construtivo e sem reticências de Roma. Na língua, com efeito, expressa-se tanto a actividade subjectiva como a forma como se comportou na luta pela vida determinado povo. O português, o idioma que a V. Exas. aprouve me tomassem para símbolo de celebração, visto nos grandes cultores, Camões, Vieira, Eça, Camilo, é uma polifonia magistral, e estou em crer que, sob o aspecto de ressonância das grandes emoções, a cólera, o ódio, a raiva, o amor, a saudade, valha os idiomas mais consagrados do mundo. Além disto a língua é a interpretação de um modo de viver e o somatório de fórmulas do próprio viver. Que existência mais atribulada, mais difícil, mais aventurosa e arremessada a todo o quadrante dos recursos que a da família portuguesa, agarrada a um fragão árido, apenas tendo recebido a graça de o inundar o sol e ter aberto o lado do mar? Estou, por isso em crer que poucas línguas terão a riqueza léxica, fruto de uma psicologia de gente pobre e danada, se quiserem dum instinto, como possui a nossa. Reparem como cada vocábulo, nada mais que com a rabugem de aumentativos e diminutivos, constitui uma gama de sensações ou evocações apenas comparável a uma arcada de violino.
O francês, o alemão serão mais profundos em racionalidade e poder de síntese, mas para traduzir o sentimento, o desespero humano, a pequenez de mortais, a angustia de ser e o pessimismo em face da muralha de bronze, atrás da qual se esconde o enigma da existência e a inutilidade, pelo menos aparentemente, da nossa freima terrestre, não haverá porventura segunda, excepção feita das línguas orientais, em que para nós tudo é selava e mistério. A nossa língua porém, de ouvido á escuta ao imediatamente humano, cultivando acima de tudo a primitividade e transes vitais do incola planetário, acabou por tornar-se também numa excelente tabuada psíquica. Ora eu creio que é, em tanto que exercendo-se na passagem do sensorial para o intelectivo, que a minha obra deverá ser encarada e analisada.
Como já tive ocasião de notar, o homem é produto de si próprio. Claro que este produto de si próprio implica uma predestinação. Digamos desde já predestinação fisiológica, para não criar confusões mentais.Com a aplicação vem a aptitude e, vou mais longe, o entendimento e a percepção adequada das coisas. Não diz o ditado que en forgeant on devient forgeron? De modo que ao fim e ao cabo – e proclamo-o com exaltação antropológica – a obra do escritor mais requintado, dum Gide, dum Huxley, não vale mais, em matéria de quilates que a do estaturário rude que modelou as gorgonas de Notre Dame. Toda a questão de mérito vai no género da tarefa e esta na direcção que se lhe imprimiu. Pode o estatuário servir-se de barro ou pedra, o escritor da luz interior que detém e é património comum acumulado e substanciado em sons ou sinais. E não tenham como exagero empregar o termo luz. Certos livros, a Ilíada, a Ressurreição, o Puits de Sainte Claire são verdadeiras teias de luz que nem pedida ao espectro ou ao zodíaco, consoante.
V. Exas. rendem pois o seu preito a um artífice que apenas encaneceu no seu tear de estopa grosseira e raro de cambraia fina. Devo advertir que nesta factura se vê porventura o homem do Norte, da Meseta e se não é atrevimento, como tal adstrito à latitude do Porto, formado aos ventos que sopram da barra de Leixões, e às auras que levavam da Praça de D. Pedro e dos gabinetes e salas de conferências, as vozes de Guerra Junqueiro, de Bruno, de Basílio Teles e doutros. Quer queiram, quer não, sou e me confesso sufragâneo do clima psicológico desta terra que possui o privilégio da liberdade e do labor. E honra seja dos portuenses. Nestes dois fulcros reside a expressa condição do progresso. O Porto, por todo o fim do século XIX e princípios do XX, foi a aula e centro de irradiação das ideias democráticas que vieram a predominar e impor-se em Portugal. Nela tirei o diploma que venho ostentando nos meus livros e pela vida fora, que já não é breve. E, de passagem seja-me permitido observar que o Porto não pode cumprir a sua missão geopolítica de capital do hinterland, na totalidade, mormente para aquela parte das serras onde me criei e fiz homem. As linhas de comunicação, sejam estradas, sejam caminhos-de-ferro, inflectem invariavelmente para Sul. Como se deixou esta cidade esbulhar do seu papel de empório para estas regiões que deviam estar no orbe da sua influência? Pois a mala-posta, que me havia de arrancar aos meus barrocais, metia a Sul. Os caminhos velhos dos almocreves e regatões, que trouxeram o juiz de Barrelas a dar conta à Relação do Porto da sua sentença, mais anfigurica que os enigmas de Édipo, esses continuaram fiéis à operosa cidade marítima. Mas o Malhadinhas foi o derradeiro almocreve a tanger o macho das terras do Paiva para terras do Vouga ou do Douro.
Eu fui vitima desta descentração da orgânica rodoviária e administrativa, e em vez de vir fazer o meu aprendizado de pessoa útil no Porto, cidade do esforço, da visão sem aranheiros, da aversão ao compósito e à hipocrisia, deixei-me conduzir pelas vias divergentes para a corte, como diziam os espanhóis da cidade capital do reino, ao tempo dos reis, da traficância politica, e dos marialvas. A reacção do montanhês a este meio de falsa civilização e entendimento furta-cores da vida, aferida e ratificada com meia dúzia de anos de Paris, gerou a minha obra.
Já vou longe nas minhas divagações supérfluas para a magnanimidade e o bom sentido social que os homens do Porto põem nas suas demonstrações de bizarria e arte de acolher as pessoas que lhe caem no agrado. Confesso-me exalçado na minha caneta de vintém e serei o arauto perante os meus colegas de Lisboa e do resto de Portugal que esta cidade com os seus Fenianos, o seu benemérito Ateneu, as várias sociedades de cultura e recreio, além de baluarte das liberdades, que sempre defendeu a peito rasgado, desdobra uma rede inconsútil de carinho e simpatia que nos cativa para todo o sempre-»


A conferência de Aquilino Ribeiro no Clube dos Fenianos Portuenses terá sido o seu último acto público, pouco antes da sua morte.

Este texto foi "transcrito para letra de forma" pelo seu filho Aquilino Ribeiro Machado e facultado para publicação pela Confraria Aquiliana.

Hoje, alguns anos depois de me ter chegado às mãos, aqui fica para memória futura.

Mais uma vez, tento saber em que data teve lugar esta conferência. Será que alguém me irá responder?

Sobre o escritor podem consultar o artigo já publicado aqui na Alameda Aquilino Ribeiro .

Com os meus agradecimentos à:

Confraria Aquiliniana
Avenida da Liberdade, n.º 60
Vila Nova do Campo
3510 - 651 VISEU


confraria.aquiliniana@gmail

31.1.14

Efeméride - 31 de Janeiro 1891 no Porto

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Para relembrar a revolta


Mas como para além dos actos colectivos também há vidas pessoais aqui vai uma pequena história escrita aqui há uns anos


(A foto é da rua 31 de Janeiro)




“O rapaz tinha à sua frente uma ladeira cheia de movimento na rua ladeada de tabernas.

Acabara de chegar à estação do Pinheiro vindo de Barcelos.

Era Janeiro, estava frio, como o dinheiro era pouco tinha que ir a pé até à morada que estava escrita num papel que tinha no bolso. Não sabia se era longe ou se era perto mas aos 16 anos chegaria até ao mar se fosse preciso.

Lá ao cimo estava o Freixo, depois seguiu por uma grande rua recta. Seguia o movimento dos carros e das pessoas. A trouxa pouca coisa tinha, não pesava.

Naquela manhã pensava que tinha a vida à sua frente, mas ia andando sempre, não tinha a noção do tempo, só sabia que era longe, que tinha que passar para além da grande praça. Mas muita gente ia naquela direcção, parecia um dia de romaria. Não se espantou.

Por fim, lá chegou à Batalha. Uma grande confusão. Muita gente, cavalos, bois. Nunca imaginara que uma cidade seria assim.

A certa altura ouviu tiros, gente a correr, balas a assobiar. Não sabia o que se passava. Agarrou com mais força a trouxa com a roupa, descalçou os tamancos. Correu na direcção contrária de onde vinham os tiros, de onde pensava que vinham os tiros. Seguiu os outros pela rua do Cimo de Vila.

Abrigou-se numa porta da rua Chã, encostado ao granito da ombreira. Não sabia onde estava, não sabia para onde ir, pensava-se protegido.

A porta abriu-se e um homem perguntou-lhe o que estava ali a fazer. Que entrasse, senão ainda apanhava uma bala perdida.

E o rapaz entrou. Inácio Ferreira da Silva tinha encontrado um marçano para o ajudar no seu comércio. Teodósio de Faria, naquele momento encontrou um patrão, não aquele a que vinha destinado. Anos mais tarde tornar-se-ia genro do Inácio. “

Foi assim que chegou o pai do meu padrinho ao Porto, na manhã do 31 de Janeiro de 1891. Talvez por esta razão todos os seus filhos se declaravam republicanos.

A história foi-me contada nos anos 90 do século XX por um irmão do meu padrinho, em S. Miguel de Ceide. Eu ainda não a conhecia apesar de ter privado muito com a família nos anos 60.





30.1.14

Porque amanhã é 31 de Janeiro






Lugar do 31 de Janeiro na História



Texto de Pedro Baptista




O período de 1873 a 1896 é marcado, na Europa, por uma grande depressão económica e financeira a que corresponde um crescendo da agitação do movimento operário. 


Em Portugal, a crise é sobretudo industrial e comercial, provocando um agravamento tributário e um excesso hipotecário e cambial, a que corresponde uma profunda crise social, com grande encerramento de postos de trabalho, que se expressa não só no levante das lutas operárias como num fortíssimo fluxo emigratório para o Brasil, autêntico “gado humano”, no dizer de Oliveira Martins. 


No Porto, a crise sente-se com grande intensidade a partir de 1889. Como se a falência do projecto de ligação Porto-Salamanca e a filoxera a destruir o Douro não bastassem, o governo decreta a lei da selagem que leva ao encerramento de armazéns contra os privilégios da Companhia Vinícola e ao agravamento da crise e agitação sociais.


Eis a terra revolvida e úbere onde cairia o ultraje do Ultimatum vitoriano, um autêntico diktat contra a soberania portuguesa, com o lanço trazido da Conferência de Berlim de 1885 onde as grandes potências procuraram redesenhar os impérios coloniais, com evidente prejuízo do português. O rei e o governo de cócoras, um clamor nacional de protesto encimado pelo partido republicano. Queda do Governo, tratado de 20 de Agosto de 1890 apresentado ao país por António Enes, num modus-vivendi como uma vitória a iludir alguns . A pena demolidora de Sampaio Bruno, depois de duas décadas de desmontagem dos fundamentos da monarquia, colocando o debate político já não entre monarquia e república mas entre república federal ou unitária, agora a demonstrar com a sua característica profundidade racional, argúcia argumentativa e cultura excepcional, que nem tudo o que luz é ouro e a despatinar a palha dourada encenada pelos monárquicos liberais de Enes, aquele que Eça acusou, nas “Farpas”, de ter desertado das fileiras republicanas para ir fazer de sentinela à porta do partido histórico . O modus-vivendi de Enes melhor seria um modus-moriendi ! !


A propósito do ambiente de Setembro, a seguir ao Tratado, Basílio Teles escreveu: “Se houve instante, nesse ano de 1890 tão fecundo em peripécias, em que o sentimento nacional estivesse incondicionalmente à disposição dessa minoria de rebeldes, foi sem dúvida alguma, este. Nesses dias de torturante ansiedade Pinheiro Chagas pode escrever sem sombra de exagero literário, que não foram os monárquicos, mas os republicanos, que mantiveram a desprezada coroa na cabeça de D.Carlos” .


E acrescentou: “Não se queria atender que a humilhação não estava nas palavras mas nas intenções e nos actos; que as amabilidades trocadas não impediam nem a realidade, nem a grandeza da extorsão; que a frase açucarada não era por isso menos cominatória e imperativa; que a iniciativa aparente de modo algum excluía a coacção. Isto viram imediatamente alguns homens, dos poucos que não corriam facilmente atrás das habilidades do escriba, entre eles, o publicista José Sampaio (Bruno) que numa série de excelentes artigos publicados no jornal republicano do Porto, desfez a teia de aranha laboriosamente estendida por Enes à crédula pacovice indígena .


Para Ruy Luis Gomes, o Porto era onde havia mais condições revolucionárias pois, dispunha de uma pequena burguesia com grande tradição e experiência na luta pelas liberdades cimentada desde 1820, dispunha de uma clara supremacia operária em relação ao resto dos sectores populares e, finalmente, por ser a cidade que dispunha de um pensamento político e especulativo mais autónomo e mais atento aos problemas da ciência e da filosofia, ou não fosse onde Sampaio Bruno pontificava . 


O Porto do Século XIX, no dizer do insigne matemático, com base nos estudos efectuados por uma comissão dirigida por Oliveira Martins, era a única cidade industrial do país, contando, em 1881, de 108 mil habitantes, 37 377 a viverem da actividade industrial, chegando a percentagem operária, em 1890 e 1900, a atingir os 50% da população . 
Ponto de vista já enunciado por Basílio Teles para quem “não resta senão o Porto capaz de conduzir uma revolução a sério” ou pelo jornalista Heliodoro Salgado para quem o Porto é a cidade “onde mais viva palpita agora a velha fibra revolucionária adormecida em 1847” .


Pontos contestados por A. H de Oliveira Marques em “a Propósito do Ultimatum e do 31 de Janeiro” que considerava que no Porto “o fermento revolucionário era sem dúvida menor do que em Lisboa” . No entanto, quando se vai procurar o fundamento da propalada indubitabilidade historiográfica, encontra-se apenas uma opinião sem suporte, vislumbrando-se, com espanto, nas considerações do grande historiador, o fermento do sectarismo bairrista que ancestralmente opõe Lisboa à Cidade do Porto.


Pelo contrário, sendo certo que a agitação revolucionária estava em levante em todos os poucos grandes centros urbanos do país, acelerado pela vergonhosa submissão da monarquia portuguesa aos ditames da Rainha Vitória durante todo o correr de 1890, e que Lisboa era um dos locais onde mais se centrava a conflitualidade política com numerosas manifestações republicanas e uma brutal repressão, ou não fosse a própria sede da Monarquia, é também certo que o Porto, além de alimentar o mesmo tipo de agitação republicana, reunia de sobremaneira as condições apontadas por Ruy Luís Gomes, onde é necessário sublinhar o papel da imprensa revolucionária, em particular da “República”, que se publicou entre Abril e Agosto de 1890, a que se seguiu a “República Portuguesa”, onde João Chagas zurzia com assinalável pontaria e audácia o cadavérico regime e, como já vai dito, o filósofo Sampaio Bruno aprofundava os pontos de vista republicanos imprimindo-lhes o mais demolidor fundamento argumentativo, racional e filosófico.


De resto não foi por acaso ter sido o Porto a eleger, logo em 1878, por grande maioria, o primeiro deputado republicano na pessoa do professor Rodrigues de Freitas…


A.H de Oliveira Marques afirma ainda que o movimento foi débil e extemporâneo, sem o acordo do PRP nem da Maçonaria que se teriam oposto, sendo tudo isto bem conhecido.
Sem dúvida e bem conhecido mas, afinal, apenas com base numa comunicação apresentada em 1990 por Fernando de Sousa onde esta opinião é expressa, mas não é mais do que uma opinião tal como a de Oliveira Marques.


Se há espírito livre em relação a tudo e crítico do 31 de Janeiro (31 J), embora sempre numa perspectiva revolucionária, é o de Basílio Teles, cujo carácter revelado na obra literária, filosófica e política e na actuação de toda uma vida merece o maior crédito.


Que nos relata que o mês de Janeiro viu assomar, no Congresso realizado em Lisboa, uma divergência profunda no Directório do Partido republicano, certamente interactiva com divergências na Maçonaria, que se saldou no afastamento de José Elias Garcia e na ascensão de Francisco Homem Cristo .


Heliodoro Salgado, por sua vez, esclarece que o novo Directório que desde há muito trabalhava na preparação da sublevação anti-monárquica, de onde ele próprio se vira afastado, não era composto por traidores mas por republicanos que queriam tanto como os anteriores fazer a revolução. No entanto, “cegara-os o ódio contra Elias Garcia”, a vetusta e carismática figura que era o líder do partido, tendo as circunstâncias em que o processo decorreu denotado profunda deslealdade e mesmo “uma traição de facto” .


É que os que se alcandoraram ao poder no Congresso estavam perfeitamente cientes do que se preparava no Porto, acalentado ainda mais pela publicação do Manifesto-Programa do PRP redigido por Teófilo Braga, Bernardino Pinheiro, José Jacinto Nunes, incluindo o novel líder Francisco Homem Cristo que vem ao Porto, fala com os operacionais e, salvo pequenas divergências, manifesta-se de acordo com a acção.


No entanto, para o plumitivo republicano, o novo Directório queria que Elias Garcia e todos os seus apoiantes fossem marginalizados, fazendo “ uma república exclusivista, sacrificando odiosamente todos os velhos elementos de acção” . 


Ora no dia 27 de Janeiro, além da condenação a prisão do jornalista João Chagas, redactor de “A República Portuguesa”e da publicação em “Debates” de uma “Prevenção”, segundo Heliodoro, da autoria do Tenente Homem Cristo, onde se denunciavam os preparativos insurrecionais, o governo, como nos narra Basílio, desistiu de remédios prontos e enérgicos e optou pelas transferências. Vendo-se ou presumindo-se descobertos os ameaçados consultaram-se e resolveram defender-se apelando para a fidelidade, na hora do perigo, do partido revolucionário .


A essas transferências de militares suspeitos de alinhamento com o levantamento republicano, estes, constituídos sobretudo por sargentos, antes que fossem inteiramente dispersos, responderam com a antecipação da data insurrecional, segundo Hediodoro, não esperando pela data que Elias Garcia tinha combinado com os militares da “província”.


Alves da Veiga conseguiu adiar de 29 para 31, mas depois teve de ceder ao dilema colocado pelas evidências apresentadas pelos militares: ou se avançava antes das transferências ou não havia mais condições para a decisiva participação dos militares disponíveis que eram sobretudo os de baixa patente. 


Diz-nos Basílio Teles que “as cousas precipitaram-se com tal rapidez que, ainda sem os motivos a que vimos aludir, seria muito difícil levar essa espécie de conselho de guerra a uma resolução unânime” . Assim se chegou ao 31J.


Ora a seguir ao 31J o GOL irradiou os irmãos das lojas do Porto onde pontificavam figuras como Alves da Veiga, mas essa condenação pode ser apenas uma expressão da má consciência de terem deixado isolada a insurreição portuense, como se pode depreender do facto de tal condenação ser tão extemporânea que levou a uma forte contestação entre os próprios maçónicos lisboetas, sendo que o próprio Oliveira Marques que tem um olhar historiográfico sobranceiro sobre a insurreição, reconhece que aqui houve exagero. Aliás o GOL tanto parece ter agido por má consciência que, pouco depois, levantou a irradiação que tinha intentado contra Augusto Manuel Alves da Veiga. De notar que Oliveira Marques acaba por reconhecer que provavelmente o 31 de Janeiro terá tido grande apoio popular mas que esse “estudo precisa ainda de ser elaborado” .


Aliás , um ou outro historiador são pródigos em referências apoucando a dimensão do 31J, tanto no que diz respeito à participação popular como à militar - reduzindo-a a uma sargentada, repetindo a expressão usada, noutra perspectiva, por Heliodoro Salgado.


Como se sendo uma capitanada ou uma generalada tivesse um papel mais digno que um insurreição que mobilizou entusiasticamente milhares de civis a enquadrarem centenas de sargentos e praças da guarnição intencionalmente debilitada da cidade do Porto. Até porque desde muito cedo que o grosso dos oficiais se mantinham fiéis ao regime que lhes tinha reforçado as prebendas, em particular o pré, sabendo-se que era na massa dos sargentos e dos soldados, lado a lado com os diversos sectores populares civis, incluindo a pequena-burguesia urbana, que fervilhava o ideal do derrube do regime monárquico.


Até se poderia dizer que a insurreição do 31J se fez contra os oficiais, não só pelo pequeno número de aderentes nessa patente, como pelo papel pérfido do comandante de Infantaria 18(I 18) lançando por terra os códigos de camaradagem militares, como ainda pelo facto de os oficiais do I18 terem tomado a iniciativa de manterem sequestrados nas casernas os soldados para estes não aderirem à insurreição.


O insuspeito Basílio Teles acentua o carácter popular, tanto na vertente militar como civil, e enfatiza a ousada iniciativa arrancada partir dos soldados. E foram os paisanos a tomar a iniciativa de investir contra o portão de I 18. “ Pela primeira vez no nosso pais, a multidão obscura que vegeta nos quartéis ou se agita vagamente nos bairros da miséria, veio gritar francamente, à luz do dia, que está farto da monarquia e dos Braganças“ . E noutro passo referindo-se ao ataque decisivo ao I 18 para libertar os soldados sequestrados pelo comando: “O assalto à porta da Lapa é, essencialmente, uma destas façanhas populares que se nos deparam com frequência na história das insurreições, e que seria absurdo, além de injusto, imputar a dois ou três cabecilhas como seus autores exclusivos” .
Ora sendo Basílio Teles crítico como ninguém do plano insurrecional do 31J, assumindo-se aliás como um estratego da necessário revolução, porque haveria de louvar o que não houvesse a louvar ou inventar factos onde eles não existissem?


Lendo os relatos fidedignos do 31J, fica-se com a ideia, evidente, de uma insurreição de planeamento insípido, em que o idealismo voluntarista substituiu o rigor dum plano operacional, a fé na vitória substituiu a exigência de confirmação dos apoios prometidos, e o romantismo substituiu a desconfiança conveniente face ao comportamento humano, enquanto se acalentam as ilusões de não-violência num acto que é violento por natureza.


Fica a ideia de uma insurreição lançada com uma grande margem de imponderabilidade, mas foram assim grande parte das revoluções em todos os lugares e em todos os tempos. O próprio 5 de Outubro foi dado como perdido, levando ao suicídio de um líder militar, quando afinal triunfava. A insurreição soviética venceu mas a alemã de Hamburgo pereceu, enquanto a da Baviera foi um sucesso, nada se podendo atestar sobre a competência operacional dos bávaros em relação aos do Norte da Germânia. 


Podemos perorar com milhares de páginas sobre as causas positivas das vitórias e as negativas das derrotas, mas depois das coisas ocorridas é fácil esse tipo de perorações analíticas… Depois do baptizado, não faltam padrinhos… A Revolução de Fevereiro de 1927 falhou por carência de adesões nacionais embora dirigida ao mais alto nível, e falhou como podia não ter falhado se Lisboa tivesse alinhado a 4 e não a 7, a intentona da Mealhada falhou porque não pegou embora se considerasse que as condições estavam maduras para que uma fagulha incendiasse a planície, falharam inúmeras tentativas em 48 anos de ditadura por um motivo ou por outro ou por motivos ignotos, falhou a antecipação spinolista do 16 de Março de 1974 e falhou por que outros não aderiram, e o 25 de Abril, sem dúvida mais bem organizado, bem comandado e bem estribado em comunicações, ainda assim podia ter falhado em lugar de vencido, porque o aspecto emocional da adesão ou não das forças que são constituídas por pessoas, para o sucesso da onda revolucionária, continua a ser de medição e prospecção dificílima e é por isso que esse é o clímax trágico dos processos insurrecionais. Mais um minuto ou menos um minuto, uma palavra mais mansa ou uma palavra mais brava, um aceno de sedução ou um tiro de revólver, uma afirmação acreditada ou pelo contrário rejeitada, um carácter mais indómito ou mais dúbio, podem determinar para que lado cai o castelo de cartas. Mas se o 25 de Abril tivesse falhado não faltaria quem verberasse a falta de madureza das condições, a falta de um plano, a actuação ridícula dos operacionais, etc. etc….


A ingenuidade do Capitão Leitão, acreditando nos cânticos sibilinos do Coronel Lencastre prometendo a adesão do I 18 e no coração revolucionário do Major Graça que haveria miraculosamente de pôr a Guarda Municipal ao lado da República, são estremes em matéria de ingenuidade humana e inépcia política, mas nada de inusual neste tipo de levantamentos. Não foi pelo desembarque de um marinheiro ferido que terá abortado a operação Dulcineia comandada pelo intrépido Capitão Galvão habituado a todo o tipo de planos e quadrículas? Não se deixou o General Delgado cair na armadilha montada pela PIDE, convencido que se ia encontrar com dois oficiais do Exército, quando caiu nas garras dos assassinos da PIDE? Todos os que perdem foram ingénuos, ou se apresentaram mal preparados, ou cometeram erros grosseiros que alguns críticos, mormente historiadores, nunca cometeriam porque nunca teriam nem o arrojo nem a dignidade de se levantarem, ai dos vencidos! 


Claro que se pode e deve analisar a posteriori os erros das batalhas perdidas, mas convém sobriedade, rigor e a competência de discernir o que são erros de decisão ou actuações pusilânimes, de acções que dificilmente poderiam ser de outra maneira, actuações de risco que tanto podem correr bem como mal mas são as necessárias porque nas condições concretas não há outro caminho.


Foi um erro de consequências incalculáveis, desistir de tomar I18 depois de arrombado o portão pelos machados da força popular, prendendo o Coronel Lencastre e portanto, como afirmava Basílio, respeitando-lhe os escrúpulos. Na análise minuciosa do pensador portuense, os dirigentes civis deviam ter imposto a sua autoridade face à incapacidade do dirigente militar. O mesmo no referente à Guarda Municipal. Numa revolução pode procurar-se o mínimo da violência mas tem de se estar preparado para os maiores embates. Houve sem dúvida um excesso de optimismo dos insurgentes pensando que se poderia repetir o cortejo triunfal de 1820 e que o facto da banda entoando “a Portuguesa” arrastar atrás de si multidões, em plena madrugada, pelas ruas do Porto, significava ipso facto adesão certa da guarnição militar em particular do seu sector mais operativo, o da Guarda Municipal.


Também a preparação política do levantamento deixou a desejar, pois os republicanos não encetaram contactos com os socialistas nem outros representantes do operariado, o que levou Ruy Luís Gomes, talvez desejoso de enviar um sinal para os tempos em que falava (1951), a apontar como um erro maior do 31 J a falta de unidade das forças populares. Só já depois de varridos da Rua de St. António e encurralados na Câmara Municipal é que gizaram in extremis um plano de contra-ataque e de diversão que contaria com o apoio organizado dos operários, através de conversações com o socialista Luís Soares. Mas era preciso tempo e já era tarde. A artilharia já despejava a bombarda e a Guarda Municipal descia St.António. Os revoltosos estavam cercados, resistiriam durante hora e meia mas depois sucumbiram. As tropas que, de Barcelos, Braga e Guimarães, se movimentavam para o Porto não poderiam chegar a tempo. E o telégrafo mantinha-se nas mãos da monarquia. Nem os últimos cartuchos se puderam queimar.
A verdade é que se alguns detalhes tivessem corrido de forma diferente do que correram, o 31 J poderia ter sido vitorioso. O combate poderia nem ter existido ou ter durado muito menos da hora e meia que durou. Em “A República Portuguesa”, às 4 da matina, vai para a máquina o número do 31 J onde transborda a certeza na vitória. Chagas está preso, foi provavelmente Bruno a escrever aquelas palavras. A República poderia ter sido proclamada em Portugal a partir do Porto, não por nove horas, mas para sempre, dezanove anos antes de ter ocorrido a partir de Lisboa.


Só que desta vez a sorte das armas, depois de também balancear para um lado e para outro, acabou por inclinar-se para o lado republicano! Demorou tempo a germinar, depois da sementeira de 1891, mas acabou por despontar e florir! 


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Agradeço ao Pedro me ter disponibilizado o texto para publicação aqui.
A imagem é minha e data de 2005 ou 2006, peço desculpa pela má qualidade.




13.7.13

Rua D. João IV

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Esta rua anteriormente já teve o nome de Duquesa de Bragança. A minha avó materna preferia chamar-lhe "Rua dos Heróis de Chaves".



17.5.13

Rua do BONFIM

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Esta artéria aparece no Roteiro de 1933 como rua do Poço das Patas. 


Sobre a Freguesia do Bonfim


Outrora periférica, a freguesia do Bonfim cresceu ao longo dos antigos caminhos de Gondomar (Caminho do Padrão de Campanhã, actual Rua do Heroismo) e Valongo e Penafiel (actual Rua do Bonfim); e cresceu em torno do Monte das Feiticeiras, onde fora erguido o cruzeiro da duodécima estação da Via Sacra, também designado do Senhor do Bom Fim e da Boa Morte. A fisionomia do local foi sendo  alterada, sobretudo no século XIX, o que levou à criação da Freguesia do Bonfim, por Decreto de Costa Cabral, de 15 de Dezembro de 1841, desmembrada das vizinhas Santo Ildefonso, Campanhã, Sé. Reinava nessa altura em Portugal D. Maria II, e governava a diocese D. Jerónimo José da Costa Rebelo.

Entre a segunda metade do século XIX e do século XX, surgiram inúmeras fábricas e manufacturas, que fixaram população em bairros operários, criados em novas ruas, rasgadas sobre antigas Quintas, como as de Sacaes ou do Poço das Patas. Aqui e ali alguns palacetes demarcaram-se na paisagem, casas de industrias e comerciantes, por vezes brasileiros de torna-viagem, quase sempre burgueses de grande trato. Nas fachadas destes edificios colocaram-se paineis de azulejos, uns de padrão industrial, outros exempleares únicos, uns lisos e monocromáticos, outros de mil cores com desenhos que misturam estilos fin-de-siécle e arte nova, e que tanto irão caracterizar a freguesia.
Actualmente, as fábricas e manufacturas deixaram de existir dando lugar a outras actividades económicas como o comércio, as instituições bancárias, as pequenas empresas e os serviços.

O edifício da Junta do Bonfim está situada na chamada Quinta dos Cirnes de Francisco Diogo de Sousa Cirne Madureira (um dos conjurados do 24 de Agosto). O palácio foi comprado pela Junta em 1880. A arca de Água do Poço das Patas veio a pertencer ao fidalgo José de Sousa Cirne, proprietário da Quinta do Reimão (século XVI) mais tarde chamada dos Cirnes.

A freguesia do Bonfim é talvez a mais central de todas as que compõem a cidade Invicta. Conta com cerca de 35 mil habitantes e é a mais recente freguesia do Porto. Segundo dados retirados da Câmara Municipal do Porto possui uma área de 292ha. Das quinze freguesias que constituem a cidade do Porto, a freguesia do Bonfim fica em quinto lugar no que diz respeito às freguesias com maior àrea total, destacando-se em 1º lugar Campanhã.

Relativamente ao património, destaca-se a Igreja Paroquial do Bonfim, um belo monumento, dedicado ao Senhor do Bonfim e da Boa Morte. Edificado entre 1874 e 1894, em substituição de uma capela que ali existia desde 1786, esta igreja é um dos muitos símbolos da história desta freguesia. A Fábrica de Manuel Pinto de Azevedo, a Casa-oficina António Carneiro, a Avenida de Camilo, a Quinta de Sacais, o Liceu Alexandre Herculano, a Casa do Poço das Patas (Junta de Freguesia do Bonfim), o Convento de Santo António da Cidade (Biblioteca Pública Municipal do Porto), a Casa Viúva Forbes dos Braguinhas (Escola Superior de Belas-Artes), a Casa dos Viscondes de Gândara e a Quinta Wright (SMAS) são outros espaços que sobressaem no Bonfim, uma freguesia que se desenvolveu ao longo dos anos, situada numa cidade histórica, com inúmeros cartões de visita. Ao nível dos equipamentos de saúde. Além do elevado número de estabelecimentos de ensino, comércio, a freguesia conta ainda com um grande número de colectividades, que cumprem um papel decisivo no desenvolvimento cultural desta freguesia. O Bonfim continua a ter avenidas com árvores centenárias (Avenida Camilo e Avenida Rodrigues de Freitas). Com a chegada do Metro, valorizou-se ainda mais, alargando a sua rede viária e os acessos.






16.5.13

AFONSO COSTA


Afonso Costa não tem rua nem praça, nem mesmo um simples largo na cidade. Afonso Costa está esquecido do Porto? Não é bem assim pois tem uma estátua. Poucos passam por ali a pé. Poucos perdem um pouco de tempo para lerem o que está escrito... infelizmente.


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Escultura da autoria de Laureano Ribatua no Campo vinte e quatro de Agosto.


Sobre Afonso Costa:


Afonso Augusto da Costa (Seia, 6 de Março de 1871 — Paris, 11 de Maio de 1937), conhecido apenas por Afonso Costa, foi um advogado, professor universitário, político republicano e estadista português.
Foi um dos principais obreiros da implantação da República em Portugal e uma das figuras dominantes da Primeira República.

(pode continuar a ler na Wikipédia)



"Matriculou-se na universidade no ano lectivo de 1888-1889, e concluiu a sua formatura em 1894. Foi premiado nos quarto e quinto anos de direito, tomou grau de licenciado em 17 de janeiro de 1895, fez ato de conclusões magnas em 24 e 25 de maio do mesmo ano, e doutorou-se em 9 de junho ainda em 1895. O seu primeiro despacho para o magistério foi em abril de 1896, e em agosto de 1900 foi nomeado catedrático. O dr. Afonso Costa, nome por que é mais vulgarmente conhecido, era considerado como um dos académicos mais notáveis do seu curso e, quando nomeado lente, era o mais novo de todo o corpo catedrático. No exercício da advocacia revelou-se sempre como um dos mais brilhantes ornamentos do foro português moderno.

Também se tem distinguido pelas suas ideias políticas avançadas; em 1897, no Porto, foi um dos homens que saíram a campo a protestar contra o plano do governo progressista de alienação das linhas-férreas do Estado. No comício que então se realizou em 13 de junho na rua do Bonjardim, foi o dr. Afonso Costa um dos oradores mais fluentes, apresentando-se pela primeira vez publicamente ao povo do Porto; e foram tão convincentes as suas palavras, que desde logo ficou considerado um dos mais valiosos vultos do partido republicano. Noutros comícios que se realizaram seguidamente na mesma cidade, também o dr. Afonso Costa tomou parte, sendo os seus discursos sempre ouvidos com o maior interesse e atenção. Quando a peste bubónica se declarou no Porto, no verão de 1899, o regime excepcional das medidas preventivas a que a cidade foi submetida por ordem do governo progressista, determinou contra ele o descontentamento geral da população. Aproximavam-se as eleições de deputados, e o partido republicano do Porto apresentou as candidaturas do dr. Afonso Costa, de Xavier Esteves e de Paulo Falcão. As eleições realizaram-se a 16 de novembro, e depois de grandes lutas entre monárquicos e republicanos, ficaram eleitos os três candidatos apresentados, mas o governo conseguiu que esta eleição fosse anulada arbitrariamente, no tribunal de verificação de poderes. Este facto ainda exaltou mais os ânimos, incitando-os a novas lutas. Em 21 de janeiro de 1900 saiu o primeiro número do jornal republicano O Norte, e os três candidatos eram novamente apresentados ao sufrágio dos eleitores independentes, como o haviam sido anteriormente na Voz Pública. O acto eleitoral realizou-se a 18 de fevereiro seguinte, e a despeito de todas as pressões, o Porto tornou a eleger os três deputados republicanos, facto que em todo o país causou a maior impressão. O dr. Afonso Costa apresentou-se na câmara respectiva como distinto parlamentar, e como um dos mais temíveis inimigos das instituições monárquicas. Orador fluente, os seus discursos eram calorosamente escutados. Caindo o ministério progressista, e subindo ao poder o partido regenerador, procedeu-se à eleição de deputados em 25 de novembro do referido ano de 1900, e o partido republicano apresentou novamente os três candidatos, mas desta vez não foram reeleitos."
No início do ano de 1937 foi indigitado para Grão-Mestre da Maçonaria Portuguesa, cargo que já não chegou a assumir, em virtude de ter falecido.
Faleceu a 11 de Maio de 1937 em Paris, tendo sido sepultado inicialmente em Neuilly-sur-Seine, no jazigo de Robert Burnay, sendo trasladado posteriormente, em 1950, para o cemitério de Cemitério do Père-Lachaise, em Paris.
Os seus restos mortais só em 1971 foram trasladados para Portugal, encontrando-se actualmente em Seia, no jazigo da família.