O veneziano Marco Polo muito falou a Kublai Kan, imperador mongol, da cidade fraterna que dura uma noite.
Esse relato o conheceu Italo Calvino, sem que entretanto a tenha arrolado entre as urbes invisíveis que a seu tempo deu a saber, por de todas ser a mais fantástica, tanto que se tornaria inverosímil.
Todos os anos, noite certa, quando o velho jacarandá é uma grande flor azul, nasce a cidade. Os circunspectos cidadãos com fazenda encerram seus graves ofícios e, acompanhados das virtuosas famílias, vêm para a rua folgar com os pobres, os chulos, as prostitutas, carteiristas, polícias, frades, ateus, gente de todas as crenças que ali arriba de longínquos tempos e remotos lugares.
Entre fumaça, balões, pirilampos, carrosséis, foguetes, música, comem, bebem. Incensam-se com ervas, expiam excessos em altos fogaréus saltando e, honra a um orago sem cabeça, dançam. Dançam e martelam-se. E martelam-se. Martelam-se uns aos outros, na cabeça.
Fraternal desatino.
Súbito, mariposa contra a vidraça da manhã, a cidade falece.
Augusto Baptista
O Editor deste blogue agradece ao Augusto Baptista ter disponibilizado este texto para servir de introdução aos festejos do S. João.
Relembro que o multifacetado Augusto alimenta com os seus textos, as suas imagens e a sua longa série de enigmas o blogue azul-canário.
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