Fotografia localizada no Flickr
TEATRO DE S. JOÃO ou TNSJ
O primitivo teatro toma a sucessão do teatro lírico do Corpo da Guarda no qual se deu o último espectáculo a 28 de Fevereiro de 1797.
O Teatro de S. João é inaugurado a 13 de Maio de 1798 num local onde se elevavam diversas casas, um pano de muralha e a capelinha da Nossa Senhora da Batalha. O primeiro foi criado por João de Almada, pai; o segundo foi construído de raiz por Francisco de Almada e Mendonça, filho. Francisco de Almada mostrou uma grande vontade de construir um teatro lírico no mais breve espaço de tempo possível. É talvez o exemplo de obras de grande envergadura que foram feitas a um ritmo rapidíssimo: vinte e cinco meses e quinze dias. Escolheu o arquitecto-cenógrafo que trabalhava no S. Carlos e noutros teatros de Lisboa, o bolonhês Augusto Romano Vicente Mazzoneschi que estadiou no Porto de 1797 a 1799, e o engenheiro Teodoro de Sousa Maldonado. O interior foi construído segundo o modelo da época, à italiana, isto é, em forma de ferradura. Constava de quatro ordens, cada uma de vinte camarotes, à excepção da primeira que tinha mais dois; no centro da segunda ordem estava a tribuna real. A plateia superior constava de cento e onze cadeiras, a inferior de duzentas e vinte, e as varandas de setenta. O tecto apresentava uma pintura de Apolo cercado dos retratos de Camões, Gil Vicente, Baptista Gomes (!) e Garrett. No piso correspondente à segunda ordem e em frente da entrada da tribuna real, notava-se um vasto salão de forma ovóide com admiráveis decorações destinadas a concertos de música.
O projecto desenhado data de 1796. Mas a aprovação governamental sobre um ante-projecto é de 1794. Nesse mesmo ano lançou um empréstimo por acções que rendeu 32.100$000 reis. Quando , em 1796, o projecto foi aprovado oficialmente, deu início às expropriações de um certo número de prédios que custaram 3.276$320 reis. As obras iniciaram-se a 29 de Março de 1796. Almada sabia que o dinheiro era pouco. Então recorreu à pedra dos muros da cidade, compeliu os negociantes de madeira a contribuírem com materiais do seu comércio, obrigou os carreteiros a fornecerem os transportes e levou os comerciantes a subscreverem o segundo empréstimo que abriu a 29 de Dezembro de 1797 e rendeu 23.150$000 reis. A inauguração foi no dia 13 de Maio de 1798 aniversário do príncipe D. João futuro VI do nome. Assim a cidade do Porto suportou todos os encargos.
Em 1815 o teatro tinha saldadas todas as suas dividas. A denominação de Real Teatro de S. João data de 1805 segundo um documento que empossa os representantes dos proprietários ou subscritores. Nada tem a ver com o Cerco do Porto. A escolha de João tem mais a ver com o rei de que com o santo popular do Porto. Teve uma vida de 110 anos. Com a restauração do absolutismo em 1828 a sua actividade ressentiu-se. Assim como com o Cerco. O lugar de regente foi ocupado até 1850 por maestros italianos. A cidade foi produzindo tudo o que é necessário à opera excepto cantores. Havia famílias inteiras constituídas por insignes músicos. Muitos artistas líricos estrangeiros se fixaram no Porto e aí morreram fundando descendência. Entre estes a Elisa Hensler (1859) futura condessa de Edla que casou com o viúvo de Maria II, D. Fernando. Quase todos se tornaram professores da burguesia e o Porto pôde beneficiar destes novos conhecimentos e conhecer socialmente uma época de ouro musical.
Conclusões sobre a história do Real Teatro de S. João:
1º- A iniciativa da sua fundação reproduziu o que já tinha acontecido com o anterior Teatro Lírico, isto é, partiu da autoridade superior do distrito, que igualmente chamou a si a tarefa de pôr a ideia em execução, o que conseguiu num prazo incrivelmente curto.
2º- Foram os capitalistas, os comerciantes e os industriais de transportes da cidade, as individualidades que forneceram os meios materiais reclamados pelo Corregedor.
3º- A existência do teatro lírico provocou o florescimento de verdadeiros talentos musicais nacionais e sustentou uma numerosa classe de profissionais de grande estimação, tais os compositores, os maestros, os cantores e os músicos professores de orquestra.
4º- O ensino musical atingiu elevado nível; e de tal modo a inteligência artística se desenvolveu que chegaram a possuir um acertado gosto musical aqueles mesmos que nunca haviam aprendido uma nota de música.
5º- A cidade foi sempre tão ciosa dos seus direitos à cultura musical que acabou por edificar um novo Teatro de S. João, no local onde se erguera o antigo.
Reduzido a cinzas na noite de 11 para 12 de Abril de 1908. Há uma fotografia após o incêndio.
Em Junho de 1909 constitui-se uma sociedade para a reconstrução e exploração do Teatro de S. João formada por muitas personalidades da cidade. A 22 de Fevereiro de 1910 Marques da Silva ganha o projecto para o novo S. João.
Em 8 de Março de 1910 o arquitecto Marques da Silva desiste do prémio atribuído ao melhor projecto e é encarregado de dirigir as obras de construção da nova casa de espectáculos.
Notas coligidas por Jorge Rodrigues
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História do Teatro Nacional
Adquirido pelo Estado em 1992, o São João Cine é inaugurado como Teatro Nacional São João no final desse ano, tendo como director Eduardo Paz Barroso. Programas de cariz musical predominam durante os primeiros anos de vida da instituição. A programação teatral consiste em acolhimentos de produções externas, com excepção da criação de A Tempestade, de Shakespeare, encenada por Silviu Purcarete (1994).
Entre 1993 e 1995, o edifício é submetido a obras de restauro. Reabre em Setembro de 1995 e Ricardo Pais é nomeado director, conduzindo até Julho de 2000 um projecto com personalidade artística própria, retomado em 2002, após um período em que o exercício das mesmas funções é assegurado pelo actor e encenador José Wallenstein.
Criador teatral residente, cujo labor assegura coerência ao projecto artístico, Ricardo Pais assina a sua primeira encenação na Casa em meados de 1996: A Tragicomédia de Dom Duardos, de Gil Vicente. Neste período, estabelecem-se as bases de um grande pólo de criação teatral de serviço público. O TNSJ investe na articulação com a realidade cultural do Porto através de uma política criteriosa de co-produções, envolvendo-se na criação de espectáculos com companhias da cidade como o Ensemble, Teatro Bruto, Teatro de Marionetas do Porto, ASSéDIO, As Boas Raparigas…, Visões Úteis, entre outras. Esta partilha de métodos de trabalho em todas as frentes de produção e divulgação estende-se também, desde logo, a companhias nacionais como o Teatro O Bando, Teatro da Cornucópia e o Teatro Meridional, prolongando-se no decurso dos anos a companhias como o Novo Grupo/Teatro Aberto, Teatro da Garagem, Escola de Mulheres e Teatro Praga.
Paralelamente, o TNSJ desenvolve uma aproximação aos circuitos internacionais de criação teatral, nomeadamente através da participação de criadores estrangeiros em produções próprias (destaque para o encenador Giorgio Barberio Corsetti e o videasta Fabio Iaquone) e do festival PoNTI – Porto. Natal. Teatro. Internacional. As edições de 1997, 1999, 2001 (excepcionalmente, disseminada por todo o ano) e 2004 dão a conhecer uma multiplicidade de experiências cénicas assinadas por encenadores como Robert Wilson, Eimuntas Nekrosius, Robert Lepage, Peter Stein, Stéphane Braunschweig, Jérôme Deschamps & Macha Makeïeff, Alain Françon, Ivo van Hove, Thomas Ostermeier, Anatoli Vassiliev, entre tantos outros.
Afirmando o palco como lugar privilegiado de conhecimento da polimorfia da língua, o TNSJ elege a palavra como eixo ético de todo o investimento cénico, revelando ou revisitando textos de uma ampla diversidade de autores, com destaque para os de língua portuguesa – de António Ferreira a Fernando Pessoa, de António José da Silva a Maria Velho da Costa ou do Padre António Vieira a Jacinto Lucas Pires. A estes nomes haverá ainda que acrescentar outros, clássicos e contemporâneos, da dramaturgia universal: Shakespeare, Calderón, Corneille, Molière, Otway, Wedekind, Büchner, Tchékhov, Jarry, Pirandello, Ionesco, Beckett, Goldoni, Friel, Handke, entre muitos outros.
O TNSJ consagra desde 1996 um espaço expressivo à dança. Refira-se, a título de exemplo, o ciclo Dancem!, realizado em 1996 e 1997, depois retomado entre 2003 e 2005, mas também os ciclos dedicados em anos mais recentes a criadores nacionais como Olga Roriz, Rui Horta, Né Barros e Paulo Ribeiro. Também coreógrafos como Gilles Jobin, Jérôme Bel, La Ribot, Marie Chouinard e Wim Vandekeybus são apresentados no âmbito da programação destes anos.
Encontrando na música uma particular capacidade de libertação de imaginários cénicos, o TNSJ desencadeia também experiências de cruzamento de actores com o canto (destaque-se o caso fundador de Linha Curva, Linha Turva, em 1999), de encenadores com a ópera (a título de exemplo, refiram-se O Belo Indiferente, de Francis Poulenc, 1997; O Boticário, de Haydn, 1999; e The Turn of the Screw, de Benjamin Britten, 2001), de músicos – como Jeff Cohen, Pedro Burmester, Nuno Rebelo ou Vítor Rua – com os desafios da cena. A “fatalidade cénica” da música prolonga-se em espectáculos designados “músico-cénicos” que envolvem a incursão no fado (pela sua projecção internacional, Cabelo Branco é Saudade, de 2005, será provavelmente o mais emblemático) e a participação de compositores como Rabih Abou-Khalil e Arrigo Barnabé. Assinale-se que a interdisciplinaridade cultivada no TNSJ leva também a Casa a programar, produzir e/ou apoiar diversos festivais de spoken word, performance, live art, música electrónica e música experimental e improvisada.
A par de toda a produção artística, o TNSJ efectua um investimento crescente numa política editorial capaz de contrariar a efemeridade da aventura teatral e multiplicar as perspectivas sobre as criações apresentadas. Deste esforço resultam a edição de textos dramáticos e ensaísticos (em parceria com a editora Cotovia e, depois, com a Campo das Letras), o lançamento de CDs, vídeos e DVDs de espectáculos da Casa, para além de programas e outras publicações destinadas a documentar a especificidade de cada projecto.
Reveste-se de especial significado o facto de, em 2003, o TNSJ assumir a responsabilidade pelo renovado Teatro Carlos Alberto, antigo Auditório Nacional, dirigido por Nuno Cardoso, encenador que assina nos anos seguintes diversas produções da Casa. Enquanto segunda sala do TNSJ, o TeCA afirma-se como espaço privilegiado de trabalho em colaboração com companhias e criadores da cidade, mas também como lugar originário de criação e ponto de circulação fundamental para boa parte da produção portuguesa contemporânea.
Ponto culminante do processo de internacionalização – assente até ao momento na realização do PoNTI, e também esboçada em co-produções internacionais, como Raízes Rurais, Paixões Urbanas (1997), ou na breve inscrição na Convenção Teatral Europeia durante o mandato de José Wallenstein – é o reconhecimento da singularidade do projecto artístico de Ricardo Pais por parte da União dos Teatros da Europa (UTE), que, em 2003, aprova a integração do TNSJ na rede de “teatros de arte” fundada por Giorgio Strehler. A consequência mais evidente desta adesão acontece no ano seguinte, com a realização no Porto do XIII Festival da UTE. Nestes anos, a afirmação internacional do TNSJ intensifica-se através de iniciativas como o Portogofone (edições de 2004 e 2007) e da crescente circulação de produções da Casa em palcos europeus. Espectáculos como Woyzeck, de Büchner, enc. Nuno Cardoso (2005), e diversas criações de Ricardo Pais (UBUs, de Alfred Jarry, em 2005, D. João, de Molière, em 2007, e Turismo Infinito, a partir de Fernando Pessoa, em 2008) são apresentados em grandes palcos internacionais. Paralelamente, são também promovidos intercâmbios e parcerias com estruturas como o Teatro de La Abadía (Madrid), o Teatre Lliure (Barcelona), La Comédie de Reims, o Teatro di Roma e o Teatro Stabile di Torino, assinalando o estatuto de maioridade do TNSJ no circuito europeu. A internacionalização da Casa não se circunscreve, todavia, ao espaço europeu e comunitário, mas abrange também o Brasil, envolvimento de que a digressão brasileira de Madame, de Maria Velho da Costa, em 2000, é a experiência mais marcante.
Em 2007, o Teatro Nacional São João é integrado no sector empresarial do Estado, recebendo a designação de Entidade Pública Empresarial, passando Ricardo Pais a acumular as funções de Presidente do Conselho de Administração e Director Artístico. Simultaneamente, é atribuído ao TNSJ o Mosteiro de São Bento da Vitória, que, para além de acolher vários serviços da Casa, assume a condição de espaço de apresentação de espectáculos e programas complementares.
Qualquer nota histórica do projecto artístico do TNSJ ficaria incompleta sem a menção à estreita colaboração gerada na última década com múltiplos criadores, de várias gerações e disciplinas – da representação à composição musical, do desenho de luz à encenação, passando pelas áreas da cenografia, da sonoplastia, dos figurinos, da voz e elocução, da escrita para cena, da fotografia e das artes gráficas. Esta ambição formativa está no centro da actividade do TNSJ na última década, envolvendo actores e criativos, técnicos e os próprios espectadores. Um labor movido não pela pretensão de fazer história, mas pela ambição de que a história do teatro recomece todas as noites.
Bibliografia consultada:
Paulo Eduardo Carvalho – “Cartografia hesitante de uma experiência multiforme: o TNSJ e o teatro na cidade do Porto”. Portogofone 2004 [Programa]. Porto: Teatro Nacional São João, 2004.
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