Uma rua sem saída, quase um beco, num sítio longínquo e perdido da cidade, talvez pelo seu "bucolismo" lhe tenha sido dado o nome do poeta que nasceu em S. Martinho de Anta - saloíces de tecnocratas urbanos!
Sobre a obra de Miguel Torga:
Miguel Torga, pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha, nasceu em 1907 em S. Martinho de Anta, concelho de Sabrosa, Trás-os-Montes, e faleceu em 17 de Janeiro de 1995 em Coimbra. Emigrou para o Brasil ainda jovem e, quando regressou em 1925, matriculou-se na Universidade de Coimbra onde se formou em Medicina. Esteve de início literariamente próximo do grupo da Presença, sediado em Coimbra. Por volta de 1930, estava já afastado do grupo, fundando a revista Sinal. Funda pouco depois a revista Manisfesto. Começou a ser conhecido como poeta, tendo mais tarde ganho notoriedade com os seus contos ruralistas e os seus dezasseis volumes de Diário, estes publicados entre 1941-1995. Várias vezes nomeado para o Prémio Nobel da Literatura, tornou-se um dos mais conhecidos autores portugueses do século XX.
Obras:
POESIA: Ansiedade (1928), Rampa (1930), Tributo (1931), Abismo (1932), O outro Livro de Job (1936), Lamentações (1943), Libertação (1944), Odes (1946), Nihil Sibi (1948), Cântico do Homem (1950), Alguns Poemas Ibéricos (1952), Penas do Purgatório (1954), Orfeu Rebelde (1958), Câmara Ardente (1962), Poemas Ibéricos (1965).
FICÇÃO: Pão Ázimo (1931), A Terceira Voz (1934), A Criação do Mundo (5 volumes, 1937-1938-1939- 1974-1980), Os Bichos (contos, 1940), Contos da Montanha (1941), Rua (1942), O Senhor Ventura (1943), Novos Contos da Montanha (1944), Vindima (romance, 1945), Pedras Lavradas (contos, 1951).
LITERATURA AUTOBIOGRÁFICA: Diário (16 volumes, 1941-1995), Portugal (1950).
Outras páginas sobre o autor:
Publicado aqui: Projecto Vercial
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QUANDO TUDO ACONTECEU
1907: Nasce Adolfo Correia da Rocha em S. Martinho de Anta (distrito de Vila Real). - 1920: Emigra para o Brasil. - 1925: Regressa do Brasil. - 1927: Fundação da "Presença" em que colabora desde o começo. - 1928: Ingressa na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra; Ansiedade, primeiro livro, poesia. - 1930: Deixa a "Presença". - 1931: Pão Ázimo, primeiro livro em prosa. - 1933: Formatura em Medicina. - 1934: A Terceira Voz, prosa; passa a usar o pseudónimo Miguel Torga. - 1936: O outro livro de Job, poesia. - 1937: A Criação do Mundo - Os dois primeiros dias. - 1939: Abertura do consultório médico, em Coimbra. - 1940: Os Bichos. - 1941: Primeiro volume do Diário; Contos da Montanha, que será reeditado no Rio de Janeiro; Terra firme, Mar, primeira obra de teatro. - 1944: Novos Contos da Montanha; Libertação (poesia). - 1945: Vindima, o primeiro romance. - 1947: Sinfonia (teatro). - 1950: Cântico do Homem (poesia); Portugal. - 1954: Penas do Purgatório (poesia) - 1958: Orfeu Rebelde, poesia. - 1965: Poemas Ibéricos. - 1981: Último volume de A Criação do Mundo. - 1993: Último volume do Diário (XVI). - 1995: Morre Adolfo Correia da Rocha.
O HOMEM E AS ORIGENS |
Adolfo Correia da Rocha, que será conhecido por Miguel Torga, nasce em 12 de Agosto de 1907, em S. Martinho da Anta, concelho de Sabrosa, Trás-os-Montes. Filho de gente do campo, não mais se desliga das origens, da família, do meio rural e da natureza que o circunda. Mesmo quando não referidos, estão sempre presentes o Pai, a Mãe, o professor primário Sr. Botelho, as fragas, as serranias, a magreza da terra, o suor para dela arrancar o pão, os próprios monumentos megalíticos em que a região é pródiga. Entra no Seminário, donde sai pouco depois. Emigra para o Brasil em 1920. Trabalha na fazenda do tio, é a dureza da "capinagem" do café. O tio apercebe-se das suas qualidades. Paga-lhe ingresso e estudos no liceu de Leopoldina, onde os professores notam as suas capacidades. Regressa a Portugal em 1925. Entra da Faculdade de Medicina de Coimbra. Participa moderadamente na boémia coimbrã. Ainda estudante publica os seus primeiros livros. Com ajuda financeira do tio brasileiro conclui a formatura em 1933. A família é um dos pontos fulcrais da sua vida. O pai, com quem a comunicação se faz quase sem necessidade de palavras, é um dos fortes esteios da sua ternura, amor e respeito. Cortei o cabelo ao meu pai e fiz-lhe a barba.(...) Foi sempre bonito, o velhote... Recorda os braços do pai pegando pela primeira vez na neta, recém nascida. O mesmo amor em poemas dedicados à mãe. Por sua mulher e filha um afecto profundo, também. Uma parcela de arrogância, um certo distanciamento dos homens, timidez comum aos homens vindos dos meios humildes: Nem sempre escrevi que sou intransigente, duro, capaz de uma lógica que toca a desumanidade. (...) Nem sempre admiti que estava irritado com este camarada e aquele amigo. (...) A desgraça é que não me deixam estar só, pensar só, sentir só. O desejo de perfeição absoluta e de verdade: Que cada frase em vez de um habilidoso disfarce, fosse uma sedução (...) e um acto sem subterfúgios. Para tanto limpo-a escrupulosamente de todas as impurezas e ambiguidades. Não dá nada a ninguém, diz-se. Imensas consultas gratuitas como médico, desmentem a atoarda. Não dispõe de recursos folgados, confidencia a alguns amigos. Compreende-se: por motivos políticos, a sua mulher, Profª. Andrée Crabbé Rocha, é proibida de leccionar e, ao longo dos anos iniciais, altos são os custos editoriais do que publica... A ideia da morte e da solidão acompanham-no permanentemente. Desde criança mantêm-se presentes no corpo e no espírito. Dos vinte e cinco poemas insertos no último volume do Diário, cerca de metade evocam-nas. Não porque atinja já uma idade relativamente avançada ou sofra de doença incurável. Na casa dos quarenta e até antes, já o envolvem. Não se traduzem em medo, mas no sentido do limite. Criança ainda, uma noite, sozinho, (...) desamparado e perplexo, assiste à morte do avô. O que não será estranho à obsessão. No enterro de Afonso Duarte, ao fazer o elogio fúnebre afirma que a morte purifica os sentimentos. O homem é, por desgraça, uma solidão: Nascemos sós, vivemos sós e morremos sós. Viajante incansável por todo o país e estrangeiro. Visita a China e a Índia já próximo dos oitenta anos. Pareço um doido a correr esta pátria e nem chego a saber por quê tanta peregrinação. Os monumentos entusiasmam-no. Os Jerónimos, a Batalha e Alcobaça têm sentido na Alma da nação. Mafra é uma estupidez que justifica uma punição aos reis doiros que fizeram construir o convento. Os monumentos paleolíticos fascinam-no. Sou uma encruzilhadas de duas naturezas. De variadíssimas, dirá quem bem o conhece... Morre em 17 de Janeiro de 1995. Enterrado em S. Martinho da Anta, junto dos pais e irmã." |
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