21.4.08

Hotéis da Praça da Batalha do tempo da 'mesa redonda'

Naqueles tempos (finais do século XIX) os hábitos familiares eram muito diferentes dos de hoje. Por exemplo, almoçava- -se cedo, às oito horas, jantava-se às duas (14 horas) "quando o sino da Sé tocava a chamar para o coro", conta um cronista da época; e ceava-se das nove para dez (da noite) "quando tangia o sino de recolher também chamado dos mariolas", acrescenta o cronista. Isto era o que se passava, digamos assim, em família. E fora de casa, como era ?

Havia na cidade um sem-número de restaurantes e hotéis, onde também se servia refeições. Nos finais do século XIX, só na actual Praça da Liberdade, Arnaldo Leite cita os seguintes restaurantes "… do lado nascente, "Porto Clube", "Camanho" e "Suíço" (com sala de jantar e gabinetes); do outro lado, em frente, "Europa", "Antiga Cascata", "Rainha" e ainda, à entrada da Rua da Fábrica, onde está agora a filial do Banco de Portugal", "O Potro", que espreitava para a Praça e tinham, na tabuleta, a figura do guerreiro que dava nome à casa; do lado sul, o "Internacional" onde depois se fundou a casa bancária Sousa, Cruz & Cª , Ldª." Havia ainda o "Ventura" que era dos mais afamados; o "Mesquita", o "Lisbonense", o "Adriano" célebre pela qualidade e abundância das suas refeições que servia; e o "Monteiro". Isto no que respeita a restaurantes. E hotéis?

Os mais famosos situavam-se na Praça da Batalha e imediações. Alguns anúncios da época explicam os motivos dessa localização "… próximo dos teatros e das repartições públicas…"

O hotel (ou hospedaria) da "Águia d'Ouro" que ficava onde persistem, para nossa vergonha, os restos do cinema e café "Águia d'Ouro" dos nossos dias, era onde se hospedavam os intelectuais e artistas de teatro quando vinham ao Porto, casos de Antero de Quental e Ramalho Ortigão e do célebre actor Taborda. As diárias eram de 800 e 1200 réis.

O mais célebre, contudo, era o "Estanislau" ou "Stanislau". Ficava quase à esquina da Rua da Madeira, num prédio onde, depois, funcionou o "Hotel Portuense" que a seguir viria a servir de sede à Casa de Espanha e onde, muitos anos mais tarde (1938), se instalou o Orfeão do Porto. Era célebre a cozinha deste hotel pela sua alta qualidade. O seu restaurante era um dos preferidos de Camilo que se zangou com o barão de Forrester por este ter contratado para o seu serviço pessoal a cozinheira que confeccionava os petiscos para a clientela do "Estanislau". Aqui uma diária variava entre os 600 e os 800 réis.

No edifício que fica à entrada da Rua de Alexandre Herculano, onde agora funciona a Messe dos Oficiais, esteve instalado o Hotel Universal, um dos mais procurados pelos lisboetas que se deslocavam ao Porto. Tinha trens para ligação, em exclusivo, com a "estação central" (S. Bento) dos caminhos de ferro. Na Rua de Cima de Vila funcionava o "Hotel Estrela" e na Rua de Alexandre Herculano o célebre "Hotel das Camélias", perto do Teatro de D. Afonso no sítio onde muitos mais tarde viria a funcionar o Parque das Camélias de saudosa memória.

Mesmo defronte ao Teatro de S. João, ficava o "Hotel da Nova Itália", uma homenagem à Itália reunificado. Era preferido pelas prima-donas que vinham actuar naquela célebre sala de espectáculos do Porto. Como muitos outros, possuía "mesa redonda às três da tarde" ao preço de 360 réis. Esta "mesa redonda" corresponderia àquilo a que hoje se convencionou chamar o "self-service".

Ainda na Praça da Batalha havia o "Hotel Sul Americano", procurado especialmente por "brasileiros de torna viagem". Ficava onde depois se instalou o "Grande Hotel do Império" e onde ainda funciona um dos modernos hotéis do sítio.

O "Grande Hotel da Batalha", que chegou com esta designação até aos nossos dias, era, nos idos de cinquenta, o mais antigo.

Nas imediações da Praça da Batalha havia, na Rua de Entreparedes, o "Hotel de Bragança", "dos mais antigos e conceituados do país, com mesas pequenas, quartos de banho e luz eléctrica" e os hotéis "Aurora do Lima" e "Estrela do Norte", com magníficos aposentos para famílias"; e ainda o "América Central" , onde está a Residencial Aviz na esquina da Avenida de Rodrigues de Freitas; o "Nacional" e o "Continental", situado, dizia um prospecto publicitário da época, "no ponto mais central, próximo da estação dos caminhos de ferro, correios, telegraphos e teatros, passando-lhe à porta os carros eléctricos para todos os pontos da cidade…"

Por Germano Silva




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