Um leitor pergunta "Além da estátua e do nome numa praça, Almeida Garrett também tem o nome numa rua?" Não tem, mas já teve. Não em uma, mas em duas.
Foi na reunião da Câmara de 13 de Outubro de 1835 que a Vereação portuense tomou a resolução de homenagear personalidades que participaram no Cerco do Porto e que, por actos de bravura, se distinguiram nessa heróica epopeia, dando o seu nome a várias artérias do Porto. Alguns nomes foram dados a arruamentos novos. Outros substituíram antigos topónimos.
Almeida Garrett foi um dos 7500 Bravos do Mindelo. Integrou o Batalhão Académico que esteve aquartelado no antigo convento dos Jesuítas, onde agora funciona o seminário diocesano. O seu nome figurou em duas artérias. Por exemplo a actual Rua do Alferes Malheiro chamou-se, em tempos idos, Rua de Liceiras, desde a Rua do Almada até à esquina da Rua de Camões. Daqui até à Rua do Bonjardim chamava-se Rua do Visconde de Almeida Garrett. Outra artéria que evocava o nome do autor de "O Arco de Sant'Ana" era a actual Rua do Padre António Vieira, em Campanhã. Chamou-se noutros tempos Rua Garrett.
A título de informação de algum interesse para quem se debruça, com curiosidade, sobre estas coisas da toponímia, como parece ser o caso do ilustre consulente, deve dizer-se ainda que quando a actual Rua do Dr. Barbosa de Castro ostentava o bonito nome de Rua do Calvário, a Câmara, aí por 1864, chegou a anunciar que ia substituir esta designação por uma outra que levaria o nome do glorioso escritor. Nunca essa deliberação foi concretizada. Segundo uma crónica da época um vereador teria justificado que a mudança não se concretizara porque, entretanto, a Câmara havia concluído que "aquela rua não estava à altura do grande nome de Garrett".
Outras mudanças que se verificaram na sequência da referida reunião camarária foram as seguintes à antiga Praça do Mirante foi dado o nome do Coronel Pacheco, que morreu num combate com os Miguelistas para os lados da Areosa; ao desaparecido Largo da Feira do Pão, que funcionava onde é hoje a Praça de Gomes Teixeira, foi dada a designação de Praça dos Voluntários da Rainha; e a Praça do Carvalhido foi substituída pela Praça do Exército Libertador. Mas isto são apenas exemplos, porque as mudanças foram muitas e não chegariam várias páginas deste jornal para as enumerar a todas. Em alguns casos até houve, num curto espaço de tempo, mais do que uma mudança, dentro do mesmo critério de se recordar os nomes e acontecimentos mais notáveis do Cerco do Porto.
Por exemplo a antiga Rua de Santo Ovídio, que depois se chamou da Sovela e é hoje a Rua dos Mártires da Liberdade, em homenagem aos Liberais que morreram enforcados na antiga Praça Nova, por terem participado na revolução de 16 de Maio de 1828, uma tentativa abortada de restaurar a Carta Constitucional que D. Miguel revogara, chegou a ter apenas a designação de Rua de 16 de Maio. Devem ter entendido os da Edilidade que a evocação apenas da data não tinha o desejado significado e mudaram para a designação actual. A Praça Nova viria a chamar-se, como ainda se chama, Praça da Liberdade, também para evocar os Liberais que ali morreram enforcados.
Referimos, até aqui, casos em que houve designações antigas de ruas ou praças que foram substituídas por nomes de Liberais ou de acontecimentos ligados à guerra civil. Mas houve situações em que foram dados nomes também ligados ao Cerco do Porto mas a arruamentos novos. Isso aconteceu, sobretudo, quando se urbanizaram as célebres Hortas do Reimão, ao longo da velha estrada para Campanhã. Em tempos muito recuados houve por ali uma vasta propriedade chamada do Vale Formoso de que foram proprietários Pedro Anes de Santa Cruz e seu filho Gonçalo Reimão tendo, anos mais tarde, o sítio tomado o nome deste. Por herança passou aos Cirnes e chamou-se por isso Campo do Cirne. A urbanização destes terrenos deve ter começado ainda no século XVII, mas foi já nos séculos XVIII e XIX que essa urbanização mais se desenvolveu. A alguns dos novos arruamentos foram dados nomes de importantes figuras do Cerco Duque de Saldanha que também tem, na Foz, a Rua do Marechal Saldanha; Rua do Duque de Terceira; Rua do Visconde de Bóbeda, para citar apenas alguns. A antiga estrada para Campanhã chamou-se, depois, Rua do Reimão no troço compreendido entre S. Lázaro e o Largo de Soares dos Reis. É hoje a Avenida de Rodrigues de Freitas. A Rua do Heroísmo evoca o mais renhido e sangrento combate que marcou o Cerco do Porto. Antigamente a artéria teve vários nomes: Rua do Prado, pela sua proximidade à Quinta do Prado; e do Padrão por causa da capelinha do senhor do Padrão ainda existente junto à Rua do Freixo. Aqui a Câmara também começou por designar a artéria pela data do combate, 29 de Setembro. Depois mudou, e bem, para Rua do Heroísmo.
O problema da mudança dos nomes de certas ruas
Em 1878, a Câmara considerou que a freguesia de Santo Ildefonso, por ser "monstruosa", isto é, enorme, devia ser dividida em duas. Para isso havia necessidade de se construir uma capela no antigo Campo da Regeneração, actual Praça da República, para servir de matriz. Esse templo, segundo os projectos da Câmara, seria da invocação de S. Luís, em homenagem ao infante D. Luís, duque do Porto. E a nova freguesia chamar-se-ia freguesia de S. Luís e S. Filipe. Na sessão camarária em que estes assuntos foram tratados constatou-se também que "não havendo ainda nesta cidade hum objecto que recorde o nome de hum Heroe da Litteratura Portuguesa, qual foi o nunca esquecido Camões," deliberou-se dar ao arruamento que vai da esquina da Trindade até à Rua do Duque do Porto, o nome de Rua de Camões. A Rua do Duque do Porto é a actual Rua de João das Regras. A Rua de Camões é hoje muito mais extensa.
Foi na reunião da Câmara de 13 de Outubro de 1835 que a Vereação portuense tomou a resolução de homenagear personalidades que participaram no Cerco do Porto e que, por actos de bravura, se distinguiram nessa heróica epopeia, dando o seu nome a várias artérias do Porto. Alguns nomes foram dados a arruamentos novos. Outros substituíram antigos topónimos.
Almeida Garrett foi um dos 7500 Bravos do Mindelo. Integrou o Batalhão Académico que esteve aquartelado no antigo convento dos Jesuítas, onde agora funciona o seminário diocesano. O seu nome figurou em duas artérias. Por exemplo a actual Rua do Alferes Malheiro chamou-se, em tempos idos, Rua de Liceiras, desde a Rua do Almada até à esquina da Rua de Camões. Daqui até à Rua do Bonjardim chamava-se Rua do Visconde de Almeida Garrett. Outra artéria que evocava o nome do autor de "O Arco de Sant'Ana" era a actual Rua do Padre António Vieira, em Campanhã. Chamou-se noutros tempos Rua Garrett.
A título de informação de algum interesse para quem se debruça, com curiosidade, sobre estas coisas da toponímia, como parece ser o caso do ilustre consulente, deve dizer-se ainda que quando a actual Rua do Dr. Barbosa de Castro ostentava o bonito nome de Rua do Calvário, a Câmara, aí por 1864, chegou a anunciar que ia substituir esta designação por uma outra que levaria o nome do glorioso escritor. Nunca essa deliberação foi concretizada. Segundo uma crónica da época um vereador teria justificado que a mudança não se concretizara porque, entretanto, a Câmara havia concluído que "aquela rua não estava à altura do grande nome de Garrett".
Outras mudanças que se verificaram na sequência da referida reunião camarária foram as seguintes à antiga Praça do Mirante foi dado o nome do Coronel Pacheco, que morreu num combate com os Miguelistas para os lados da Areosa; ao desaparecido Largo da Feira do Pão, que funcionava onde é hoje a Praça de Gomes Teixeira, foi dada a designação de Praça dos Voluntários da Rainha; e a Praça do Carvalhido foi substituída pela Praça do Exército Libertador. Mas isto são apenas exemplos, porque as mudanças foram muitas e não chegariam várias páginas deste jornal para as enumerar a todas. Em alguns casos até houve, num curto espaço de tempo, mais do que uma mudança, dentro do mesmo critério de se recordar os nomes e acontecimentos mais notáveis do Cerco do Porto.
Por exemplo a antiga Rua de Santo Ovídio, que depois se chamou da Sovela e é hoje a Rua dos Mártires da Liberdade, em homenagem aos Liberais que morreram enforcados na antiga Praça Nova, por terem participado na revolução de 16 de Maio de 1828, uma tentativa abortada de restaurar a Carta Constitucional que D. Miguel revogara, chegou a ter apenas a designação de Rua de 16 de Maio. Devem ter entendido os da Edilidade que a evocação apenas da data não tinha o desejado significado e mudaram para a designação actual. A Praça Nova viria a chamar-se, como ainda se chama, Praça da Liberdade, também para evocar os Liberais que ali morreram enforcados.
Referimos, até aqui, casos em que houve designações antigas de ruas ou praças que foram substituídas por nomes de Liberais ou de acontecimentos ligados à guerra civil. Mas houve situações em que foram dados nomes também ligados ao Cerco do Porto mas a arruamentos novos. Isso aconteceu, sobretudo, quando se urbanizaram as célebres Hortas do Reimão, ao longo da velha estrada para Campanhã. Em tempos muito recuados houve por ali uma vasta propriedade chamada do Vale Formoso de que foram proprietários Pedro Anes de Santa Cruz e seu filho Gonçalo Reimão tendo, anos mais tarde, o sítio tomado o nome deste. Por herança passou aos Cirnes e chamou-se por isso Campo do Cirne. A urbanização destes terrenos deve ter começado ainda no século XVII, mas foi já nos séculos XVIII e XIX que essa urbanização mais se desenvolveu. A alguns dos novos arruamentos foram dados nomes de importantes figuras do Cerco Duque de Saldanha que também tem, na Foz, a Rua do Marechal Saldanha; Rua do Duque de Terceira; Rua do Visconde de Bóbeda, para citar apenas alguns. A antiga estrada para Campanhã chamou-se, depois, Rua do Reimão no troço compreendido entre S. Lázaro e o Largo de Soares dos Reis. É hoje a Avenida de Rodrigues de Freitas. A Rua do Heroísmo evoca o mais renhido e sangrento combate que marcou o Cerco do Porto. Antigamente a artéria teve vários nomes: Rua do Prado, pela sua proximidade à Quinta do Prado; e do Padrão por causa da capelinha do senhor do Padrão ainda existente junto à Rua do Freixo. Aqui a Câmara também começou por designar a artéria pela data do combate, 29 de Setembro. Depois mudou, e bem, para Rua do Heroísmo.
O problema da mudança dos nomes de certas ruas
Em 1878, a Câmara considerou que a freguesia de Santo Ildefonso, por ser "monstruosa", isto é, enorme, devia ser dividida em duas. Para isso havia necessidade de se construir uma capela no antigo Campo da Regeneração, actual Praça da República, para servir de matriz. Esse templo, segundo os projectos da Câmara, seria da invocação de S. Luís, em homenagem ao infante D. Luís, duque do Porto. E a nova freguesia chamar-se-ia freguesia de S. Luís e S. Filipe. Na sessão camarária em que estes assuntos foram tratados constatou-se também que "não havendo ainda nesta cidade hum objecto que recorde o nome de hum Heroe da Litteratura Portuguesa, qual foi o nunca esquecido Camões," deliberou-se dar ao arruamento que vai da esquina da Trindade até à Rua do Duque do Porto, o nome de Rua de Camões. A Rua do Duque do Porto é a actual Rua de João das Regras. A Rua de Camões é hoje muito mais extensa.
Germano Silva
Publicado no Jornal de Notícias
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