esta aridez das imagens
esta aridez do mostrar coisas e de não se mostrar
por vezes tem que ser quebrada
um texto que um amigo me enviou, uma única imagem de uma obra dela.
o silêncio sobre o presente
a continuação do silêncio sobre o passado......
Preito a Irene Vilar
11 de Dezembro de 1928 / 12 de Maio de 2008
O homem chorava. Nunca sonhara poder ver ali, naquela Praça Flagey, em Bruxelas, uma cabeça de Fernando Pessoa, assim, em bronze, grande, mais uma base de mármore do seu Alentejo. Ele que viera à procura de pão, que a pátria lhe recusara, nos idos sessentas, e, naquela que seria dentro em pouco a capital da Europa, se remetera, como é costume nos seus, à mesma pacatez da aldeia de outrora, não acreditava que um país desenvolvido como a Bélgica, pudesse alguma vez ter outro olhar para ele e os seus do que um simples apreço pelo trabalho braçal que lhes vendiam no dia a dia e uma integração sem ruído que lhes era natural.
Não! Ali estava um poeta da sua língua, bem exposto, soberbo, numa praça principal, aos olhos de todos, dos seus conterrâneos mas também dos belgas, dos políticos da “comuna”, dos seus patrões.
Não! Que não era apenas por um suor bem retribuído que o tinham de respeitar. Estava ali o Fernando Pessoa, a indicar que não éramos simples povo de mações e mulheres-a-dias, que também os tínhamos a escrever poesia reconhecida pelo mundo atestada ali e agora por uma pública homenagem.
Pois, que não conhecia os poemas do Senhor, apenas o nome, mas que a emoção lhe saltara com o orgulho que doravante sentiria mais forte por uma origem, muitas vezes escondida.
O homem – explicou-nos, a ti e a mim – por isso chorava.
Era a manhã de 10 de Junho de 1989. Pela tarde, o Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal – de que agora não me lembro o nome – na presença de António Quadros, José Augusto Seabra, Margarida Magalhães, Cândido Lima, António Cunha e Silva, (que vieram participar na homenagem) Ivone Almeida e a Fernanda, com as autoridades camarárias locais, e muitas outras pessoas, inaugurava esse monumento a esse grande Poeta.
Hoje, esperava pelas tuas melhoras para te anunciar – e como sei que te agradaria – que as autoridades no contexto do arranjo geral da praça, decidiram dar o nome, naquele triângulo onde está o teu Fernando, de Square Pessoa.
Que novo reconhecimento, a ele e, claro, a ti, querida Mestre!
E mais, a Square vai ter (está a terminar) uma calçada nova, “à portuguesa” e todo o enquadramento vai ser renovado... e as letras do plinto pintadas, o que tanto pedias: a minha pátria é a língua portuguesa.
Queria dizer-to, esperava que arribasses, mas não foi possível. A grande igualitária passou por ti e segou-te. Estou a vê-la, inesperada, injusta, má, dizemos os que quedam, os que se seguirão.
Uma peregrinação formidável, um passar seguro e confiante, a que penas e ofensas apenas deram força e perseverança, assim foi a tua obra. Entre o Monumento ao Pescador e a Florbela Espanca, em Matosinhos, o Camões, a Suggia, o Mensageiro e o Garcia de Orta, no Porto, e os Pessoas, de Durban e S. Paulo, e o Abraço, de Macau, e o Teixeira Gomes, da Argélia, estão dezenas, centenas de obras, grandes e mínimas (recordemos as medalhas onde foste criadora ímpar, tendo ainda feito a da última Presidência da UE) que atestam um carácter, uma marca que, por certo o teu Mestre, Barata Feyo, é responsável – como repetias –, mas também as tuas viagens, a tua observação e análise, o estudo e a reflexão que permanentemente praticavas.
Ficam ainda, pelo menos, para inaugurar em breve a tua D. Leonor e o D; Fernando, que irão de novo jurar amores frente ao Mosteiro de Leça do Balio e também um Marvão, para figurar e enriquecer aquela bela povoação histórica.
Do Poeta sabias que agir é a inteligência verdadeira e por isso parar era um verbo sem presente (e futuro) em ti.
Vivias em sobressalto com o por fazer, com os outros, com as promessas esquecidas e as injustiças, mas não te atormentes mais: o triunfo é claro, os teus amigos muitos, os admiradores sem conta, a obra inextinguível.
Se é verdade (e ainda o Poeta) que Somos contos contando contos, nada, não é menos certo que, nesta minudência que é a vida, há nadas que, nesta dimensão, são tudo.
E tu, Maria Irene Vilar, foste-o.
Até sempre!
Tervuren, 12 de Maio de 2008
Joaquim Pinto da Silva
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