26.6.08

CARTOGRAFIA PORTUENSE

«Na mesma altura em que foi levantado o Cerco do Porto, que ocorreu em 1832 e 1933, o oficial inglês W.C. Clarke, que julgo ter participado nos combates integrado nas tropas fiéis ao ideário liberal de D. Pedro IV, desenhou uma planta topográfica da Cidade Invicta que nos dá uma ideia muito nítida do que era o município naquele tempo intermédio entre as épocas almadina e camiliana a que já tivemos a oportunidade de nos referir.

Analisado em detalhe esse mapa, fácil é chegar à conclusão de que naquela época o território - ao contrário dos nossos tempos - era escassamente urbanizado, com os seus limites ocidental e oriental fixados, respectivamente, no Lugar da Torre da Marca, onde hoje se encontra o Palácio de Cristal; e no Prado do Repouso, hoje cemitério municipal mas, por aquele tempo, local de vilegiatura dos senhores bispos do Porto. Entre esses dois pontos, o casario estendia-se pelas cercanias da Igreja de Cedofeita, do Campo Pequeno e da Rua da Carvalhosa, ainda a ocidente; da Lapa e Fontinha, a norte; e das ruas de S. Vítor e da Alegria, a oriente.

Triunfante como D. Pedro IV, o Rei Soldado, a burguesia portuense se encarregaria de mudar este estado da coisas. Conforme refere Gaspar Martins Pereira no livro que temos vindo a citar amiudadamente dada a valia das informações que ele colocou à disposição de todos aqueles que se interessam pela história da nossa cidade, o Porto tinha 10 anos depois da obra de W.C. Clarke, um pouco mais de 60 mil habitantes, incluindo os arrabaldes. Ou seja, a mesma que contava nos finais do século XVIII, mas que, na segunda metade de Oitocentos, vai conhecer um notável incremento que é atestado pelos censos da população de 1864, 1878 e 1890, que registam 90 mil, 110 mil e 150 mil habitantes, respectivamente.

Aceitando o convite de Gaspar Martins Pereira consultamos a planta da cidade do Porto, publicada por Perry Vidal em 1865 para ver assinaladas já as mudanças necessárias ao engrandecimento do Porto. Lá aparecem o Palácio de Cristal e a Alfândega do Porto, cuja construção se iniciara em 1860, sobre o areal de Miragaia. Lá se vê o Palácio da Bolsa, da todo-poderosa Associação Comercial do Porto, que vinha sendo construído desde 1842 nos escombros do Convento de S. Francisco mas ainda sem a maravilha da ferro e de vidro que é o Pátio das Nações. É também por essa altura que são construídos outros edifícios públicos ou privados de relevante interesse para o Porto como é o caso do Teatro Baquet, na Rua de Santo António e do rico palacete dos Pinto Leite no Campo Pequeno. Fora deste limite, o povoado é, no entanto, disperso ou, então concentrado junto das vias de penetração da cidade - e mesmo no interior da cidade ainda é possível a existência de grandes propriedades como a Quinta de Santo Ovídio, dos Condes de Resende, junto à que é hoje conhecida por Praça da República.

Voltaremos a referirmo-nos este lento crescer da cidade em outros textos. Por agora queremos chamar a atenção dos nossos leitores para um opúsculo intitulado "Viver o Porto" editado em 1993 pela Câmara do Porto quando da apresentação pública - realizada no Rivoli-Teatro Municipal - do Plano Director (revisão do Plano Auzelle) cuja autoria se ficou a dever a uma equipa técnica coordenada pelo prof. arqº Duarte Castel-Branco. Logo a abrir esse pequeno documento, podem apreciar-se dois mapas - um de 1833, precisamente o de W.C. Clarke, a que nos referimos; e outro tirado do espaço, de algum satélite artificial. Nada é mais concludente quanto ao explosivo crescimento que o Porto "sofreu" em pouco mais de 150 anos a cidade, para o bem e para o mal, ocupou todo seu território, de tal ordem que já não há expansão possível. Quanto muito reabilitação...»

Jorge Vilas


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